domingo, 27 de dezembro de 2020

Garotas não se vestem para garatos

Parte II
 
Você me olha, rápido, de relance, como quem olha para um ponto específico mas precisa fingir que está só observando despretensiosamente o espaço ao redor. Estou sorrindo, feito um idiota. Sozinho. Um copo na mão. Já nem lembro que bebida é essa. Vai ver já estou agindo sob o efeito do álcool - ah, essa velha desculpa... Vai ver esse meu interesse por você, por conta de uma frase numa camisa, seja só a desculpa que eu preciso para justificar para mim mesmo algo que eu mesmo nem sei como funciona bem. Essa coisa, sabe, de atração e conquista. Posso até usar o termo amor, mas sei que é de forma imprecisa. Sei que não é isso, pelo menos não ainda. Que idiota que eu sou. Mantenho um diálogo com você em pensamento, enquanto isso a festa segue solta, pessoas curtindo, dançando... Você segura o copo com sua bebida misteriosa azul. Cintilante. Nem te conheço direito, nem mesmo sei o seu nome, mas já tenho uma listinha incompleta sobre os seus trejeitos que mais gosto: você parece realmente interessada em ouvir os outros, percebo que, quando suas amigas falam diretamente para você, você mantém o gesto de levar o copo à boca suspenso até que a pessoa conclua o que está lhe dizendo, e só então, após um comentário, você retoma o gesto que estava fazendo; outra coisa que já notei é que você ajeita os cabelos de tempos em tempos, ajeitando-os atrás das orelhas, por sinal, belas orelhas, sustentam um par de brincos delicados, o pingente parece ser algum animal ou talvez seja uma estrela. Não sei. Já disse, dessa distância mal consigo distinguir um sentimento de outro. Miopia sentimental, afetiva. Só me resta te idealizar, achando estúpido elogiar as orelhas de alguém. A pessoa elogiada pode ver nisso um sinal velado de algum fetiche depravado. Juro que não, não é isso... Também adoro o modo como você se prepara para sorrir. Alguém lhe diz algo e logo sorrir, os dentes às mostras, a boca aberta. Você não, você primeiro faz um semi-biquinho com os seus lábios miúdos, você fecha os olhos por um milésimo de segundo e, ao abri-los, aí sim, você sorrir, um sorriso lindo, meigo... Queria tanto te beijar. Minha nossa, não posso, não devo pensar essas coisas. Nós nem nos conhecemos. Se soubesse desses meus devaneios, provavelmente me acharia um depravado piegas, desses que estão à solta por aí.

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