O cão sem plumas é um cão.
Um homem. Um rio. Sobrevive por aí. Viralata, vadio. Bate ruas. Desce escadas.
Suas costelas cinzentas. Magrelas. São tão finas, ósseas. E o cão sem plumas é
fraco frágil. Sem plumagem vistosa. Só a pele sem os pelos. Só a febre e as
sarnas. A lebre rápida passa ilesa. Que tristeza! E o cão sem plumas só se
coça, leproso. Confuso cansado. Os olhos derramados. Duas órbitas de remelas
amarelas. Suas patas atadas aos tropeços. Os passos lerdos & incertos. O
latir esganado, avesso à natureza.
O Cão sem plumas
é um homem desnudo. Uma
margem sem rio. Uma criança banguela. Sempre fiel à sua própria miséria: restos
de ossos roídos, raspas de carnes podres, migalhas de afetos lançadas ao chão
com desprezo. Ele se arrasta pelo espaço – serpente sem escamas. Amor sem véu.
Ele
se
arrasta
Se
afasta
Cai num lago, donde nasce
adormecido
A nova forma / o corpo
amorfo / um patinho-feio sem espelhos / com um coração e as vísceras de vidro /
a lhe saírem pelo peito
aberto
Finalmente voa, com suas
asas enormes, em direção às
nuvens
das profundezas
do
(M)ar